sexta-feira, 21 de março de 2008

A SOCIEDADE"MORAL E MORALISTA "


Os animais e a moral
F. Nietzschen

"As práticas que são exigidas na sociedade refinada, o evitar cuidadosamente o ridículo, o que dá na vista, o pretensioso, o preterir suas virtudes assim como seus desejos mais veementes, o fazer-se igual, pôr-se na ordem, diminuir-se - tudo isso, como moral social, se encontra, a grosso modo, por toda parte até o mais profundo do mundo animal - e somente nessa profundeza vemos o propósito que está por trás de todas essas amáveis precauções: quer-se escapar de seus perseguidores e ser favorecido na busca de sua presa. Por isso os animais aprendem a se dominar e disfarçar de tal maneira que muitos adaptam suas cores à cor do ambiente (em virtude da assim chamada função cromática"), fazem-se de mortos ou adotam formas e cores de um outro animal ou de areia, folhas, algas, esponjas (aquilo que os pesquisadores ingleses designam como "mimicry"). Assim se oculta o indivíduo sob a generalidade do conceito "homem ou sob a sociedade, ou se adapta a príncipes, classes, partidos, opiniões do tempo ou do ambiente: e para todos os refinados modos de nos fazermos de felizes, gratos, poderosos, amados, se encontrará facilmente o equivalente animal. Também aquele sentido de verdade, que no fundo é o sentido de segurança, o homem o tem em comum com o animal: não quer deixar-se enganar, não quer deixar-se induzir em erro por si próprio, ouve com desconfiança a voz persuasiva de suas próprias paixões, reprime-se e permanece em guarda contra si; isso tudo o animal sabe igual ao homem, também nele o autodomínio brota do sentido do efetivo (da prudência). Ele observa, igualmente, os efeitos que exerce sobre a representação de outros animais, aprende a voltar o olhar sobre si mesmo a partir dali, a se tomar "objetivamente", tem seu grau de autoconhecimento. O animal julga os movimentos de seus adversários e amigos, aprende de cor suas peculiaridades, orienta-se por elas: contra indivíduos de uma espécie determinada ele renuncia de uma vez por todas ao combate e, do mesmo modo, adivinha na aproximação de muitas espécies de animais o propósito de paz e acordo. Os inícios da justiça, assim como os da prudência, comedimento, bravura -,em suma, de tudo o que designamos com o nome de virtudes socráticas, é animal: uma conseqüência daqueles impulsos que ensinam a procurar por alimento e escapar dos inimigos. Se ponderamos agora que também o mais elevado dos homens só se elevou e refinou justamente no modo de sua alimentação e no conceito de tudo aquilo que lhe é hostil, não deixará de ser permitido designar todo fenômeno moral como animal."

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